Há 4 décadas, córrego era coberto e mudava paisagem de Cuiabá
Obra teve início na gestão Rodrigues Palma, e foi inaugurada três anos após seu início, com o prefeito Gustavo Arruda Muitos jovens, turistas e “paus-rodados” que passsam pela Avenida Tenente Coronel Duarte, conhecida como Prainha, no Centro de Cuiabá, não imaginam que sob o asfalto há um córrego cuja história se confunde com a da cidade.
E essa cobertura, que mudou a paisagem da região central e deu mais segurança a motoristas - pois eram comuns carros caírem na vala -, está prestes a completar 40 anos.
O projeto, ousado à época, teve início em 1975, quando o prefeito de Cuiabá era Rodrigues Palma. A obra foi finalizada cerca de três anos após seu início e foi formalmente inaugurada pelo seu sucessor, o prefeito Gustavo Arruda, no início de 1979.
Ao MidiaNews, Rodrigues Palma relatou como foi o processo, do projeto à execução da obra, considerada uma artéria fundamental para o tráfego em Cuiabá. A obra custou Cr$ 33 milhões, o equivalente a cerca de R$ 23 milhões em valores atuais.
O lugar onde hoje é a Avenida da Prainha praticamente viu nascer Cuiabá. Ali, passava o córrego a céu aberto de águas límpidas, à beira do qual a cidade cresceu.
Palma conta que em 1965 o prefeito Vicente Vuolo e o governador do Estado Pedro Pedrossian elaboraram um projeto e desapropriaram a área onde hoje fica a Praça Bispo Dom José, para canalizar o córrego até a Igreja do Rosário. A canalização, no entanto, não previa a cobertura do curso d´água, algo que aconteceria cerca de uma década e meia depois.
Após a canalização do esgoto central, Palma viu a necessidade de “fechar” o córrego para trazer, segundo ele, ares urbanos à Capital. À época, além dos acidentes, o mau cheiro trazido pelo esgoto também causava incômodo.
“Em 1975, nós emendamos a Avenida do CPA com a Avenida da Prainha. Aí, para emendar, não dava para fazer com o canal aberto. E nós procuramos o Dnos (Departamento Nacional de Obras de Saneamento) do Governo Federal, falamos com o Governo de Mato Grosso. Fizemos a composição desses três órgãos. O Dnos nos proporcionou os recursos”, relembra o ex-prefeito.
O projeto era inovador, no entanto foi muito criticado à época. Para tocar a obra, a Prefeitura precisaria interditar uma das principais vias da cidade – que ligava a região central ao Bairro do Porto.
“O projeto melhoraria o tráfego, eu tinha certeza disso. Mas a questão era: como fazer? Como fazer em uma cidade onde a artéria principal era essa? Imagina mexer da Getúlio Vargas até chegar no Porto? Era a única via que dava acesso ao Porto”.
“Eu levei tanta esculhambação. Tanta gente dizia: ‘Por que fazer isso?’. Agora, pensando nos dias de hoje, se não fosse esse transtorno, o que Cuiabá seria hoje sem essa via?”, questiona o ex-prefeito.
Em 1970, Cuiabá tinha aproximadamente 100 mil habitantes, oito vezes menos do que nos dias atuais, e a população criticava a necessidade do fechamento do canal.
À época das obras, diversos engarrafamento foram noticiados por jornais.
“O que tinha Cuiabá? Nada. Aí você vê a importância da Prainha. Não se fez e não tinha como fazer outro projeto de mobilidade igual”, afirma Palma.
“Nós começamos essas obras em 1975. O prefeito que me sucedeu deu continuidade e entregou em 1979. Isso que era bom na época: os prefeitos sucediam e continuavam as coisas dos outros”, conta Palma. Ele foi sucedido por Gustavo Arruda.
Ouro no córrego
Entre as diversas histórias que giram em torno da elaboração e construção da via, uma sempre teve força: haveria ouro nas águas do Córrego da Prainha. Dona Joselina Siqueira mora em frente a Prainha desde que nasceu: há 91 anos. Hoje, com a memória comprometida, conta das pequenas lembranças que ainda tem da época de “ouro” do córrego.
“Eu gostava de ver o córrego quando estava cheio. Lembro das crianças brincando. Lembro das pessoas ‘batendo ouro’. Quando chovia, o córrego enchia e os rapazes ‘batiam ouro’. Eles conseguiam pouca coisa, mas conseguiam”, conta Joselina.
Entretanto, com o passar do tempo e a canalização, o córrego não carregava mais águas limpas. A nascente, segundo consta, ficava em um terreno em frente onde hoje é a Clínica Femina.
“A cobertura foi boa. Porque esse córrego começou a ficar imundo, passava muito esgoto aqui”, relembra.
Atualmente
Com o aumento da população e o crescimento do fluxo de veículos, o prefeito Roberto França (PSDB) ampliou a avenida na década de 90.
A via, que contava apenas com duas faixas, foi ampliada para três. Para alargar a pista de rodagem, foi projetado que uma das faixas ficaria sobre o curso d’água.
“Quando o Roberto França foi fazer essa ampliação, chamaram um técnico, porque as pessoas tinham medo dos carros caírem na canalização do córrego, e foi perfeito. Não teve necessidade de fazer nada”, explica Palma.
Atualmente, se quisesse realizar o mesmo projeto, os gestores não conseguiriam, pois seriam vetados por leis de cunho ambiental.
“Na época da Copa do Mundo tentaram fechar o Córrego 8 de Abril [Bairro Porto], mas a Sema (Secretária do Meio Ambiente) não deixa mais. Porque eles falam que seria criador de rato, pestes e outras coisas”.
Segundo a Secretaria de Mobilidade Urbana, cerca de 37 mil veículos passam pela via por dia.